Memórias do Centauro
Tele-empáticos 22 ∕ 09 ∕ 2009
Significado da palavra empatia está
eternamente consolidado: capacidade de se colocar, posicionar, no lugar do
outro, de sentir ou perceber, compreender como este compreende, semelhante da
mesma espécie, ou de outro ser vivo, já que também nutrimos das afetividades de
outros animais. Mas todos as vezes que me foram sugeridas o cultivo dessa
substantivo, tinha alarmantes dificuldades em faze-lo. Tenho dificuldade de
imaginar alguém com poderes telepáticos, tele-cinéticos como possuem
personagens fictícios e meu ceticismo bloqueia despudoradamente a crença em
mediunidade, quando há um transladar de espirito de corpo para corpo, como num
salto metafísico, ou quântico, estaria eu dentro do alvo mirado, sentindo tudo
que meu hospedeiro sente: seu desequilíbrio emocional, os resultados de suas
ponderações, suas dores físicas, seus descontentamentos, sua apatia, seu
desprezo. Ínsito: é impossível tal competência, a não ser, é claro no hábito
das narrativas ficcionais. Nestas sim, nos permitem parodiar algo que nunca
seremos. A empatia é o mais estratégico dos sofismas, ensaiada no âmago de
nossa astúcia, com significados mutáveis, adaptáveis.
Hoje pela manhã escutei alguém chamar meu nome no balcão da oficina: - “Edson”, era um conhecido que – não lembro a última vez que esteve aqui – me convocava para prestação de mercê. Candidato a conselheiro tutelar, estava tentando reunir um considerável número de votos para uma eleição facultativa. Como o hábito educa, não demorou muita para o sujeito despejar nos meus ouvidos uma cantiga, uma versificação de tantas benevolências sua imaginação foi capaz de criara: seu altruísmo, os cuidados diligentes com os mais necessitados e, é claro, nessa enumeração folclórica de virtuosidade, não poderia falta sua capacidade empática. Foi arremetido pelo telepático e mediúnico. Dramatizou: “vim aqui pedir seu voto para conselheiro tutelar, sei que você é uma pessoa consciente e lhe garanto que farei um ótimo trabalho como as crianças da cidade,” de imediato percebi que ele conhecia pouco sobre mim e menos ainda sobre ele mesmo. Mas não posso julga-lo. O sujeito estava tão embriagado com a ideia que qualquer ilusão para uma ascendência na carreira o faria relevar os constrangimentos. E acrescento: pelo salário de conselheiro tutelar, acredito, se tivesse a oportunidade, tentaria. Mas carece-me a estilística no discurso. Pesa-me o arrependimento caso seja vitorioso na empreitada malicioso. Acabo sendo consumido em lamentações pela mal cometido. Quanto aos práticos, especialista, estes sempre são vitoriosas. Sua recompensa: galgam para o sucesso.
Após dez ou dose minutos de fabulações
do sujeito, ali estava eu, junto à pequena criatura no qual me reduzi. “terá
meu voto,” garanti-lhe. Não sei por imaculada ingenuidade ou por seu eu próprio
um praticante assíduo e disciplinado da falsa empatia. É certo que todos são
assolados desde o nascimento, num treinamento constante na direção dos valores
humanos. Mas cá entre nós, tais valores são, em percentual verdade (não creio
em humanidade absoluta), humanamente impossível. Evitamos o sofrimento, os
desprazeres, as divagações e flutuações da angustia, das mínimas insatisfações
que sejam. Somos seres dependentes da citosina, noradrenalina e serotonina.
Existindo a possibilidade que as compramos nas farmácias, como a dipirona ou
diclofenaco, em gotas, comprimidos e injetáveis, a preço acessível, nos
entupiríamos constantemente ao percebermos ao mais remoto sintoma (escrevi uma
narrativa, foge-me de minha memória a data, sobre uma sociedade que sintetizou
a citosina, hormônio do amor, e que todos o consumiam com total banalidade, e o
resultados... aí vocês terão que ler a narrativa).
Observo os aleijados em cadeiras de rodas
manuais na frente de bancos ou casas loterias, concebo: - se estivesse no lugar
dele minha infeliz vida acabaria, não suportaria depender dos outros, seria
insuportável a incapacidade de caminhar, visto que um dos raros prazeres que
tenho é uma contemplativa caminhada. Replico o menos pensamento com os cegos,
sem poderem delinear o mundo a sua volta, referenciando apenas os sons e o
tato, também os mudos e surdos, os enfermos, os enganados, os ressentidos e
descontente. Desagrado a gregos e troianos quando ínsito em desacreditar o
significado da palavra empatia. Foi só mais uma que o ser humano criou para
negar sua própria humanidade.
E o Gautama, em algum momento de sua
jornada, influenciou milhares com seus ensinamentos sobre empatia. Aceitou com
cinismo a eminência da própria morte pelo simples fato de que a vida enfadonha,
tão gordurosos foram os presentes que estas lhe deram. Quanto ao Cristo, me
refiro ao de dois mil anos atrás, passivo de imperfeiçoes como qualquer humano
célere que se prese, segurando uma libra invisível, no recomendou: - “em amar o
próximo como a si mesmo”, imagino uma tido de humano com suas emoções
renteadas, talvez porque a perfeição do espirito santo tenha esquecido de avisa-lo
que somos seres desonerados, obcecados por inventar palavras para as
deformidades emocionais. Somos cândidos nas afetividades. Somos
autodestrutivas, trágicos ao cobiçar o que não temos e mentirosos trágicos ao
fugirmos sorrateiramente das imperfeiçoes. O que nos difere dos outros seres:
somos movidos por ideias. A empatia é uma delas. A criamos e ressignificamos a
depender das conveniências: moeda de troca, capital para manipulação, um herói que
nunca seremos.
Voltando ao candidato a conselheiro
tutelar. Ao escultar a confirmação do meu voto, encrespou o rosto pelo
contentamento. Se despediu. Saindo apressadamente, como alguém encolhido em
suas próprias vergonhas. Certamente, desejasse estar em qualquer outro lugar,
menos ali.
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