Não negue. Apenas olhe. (relato de leitura)

 

        Acredito que não tenha sido este o real motivo que tenha levado Ernest Becker a projetar-se em sua empreitada para escrever seu clássico “A negação da Morte”, mas desde a minha primeira leitura – visto que tenho muitas outras em subsequências periódicas – comecei a relacionar a ideia de aceitação e controle emocional aos múltiplos significados que este obra tem a nos oferecer. Sim, todos nós morreremos. Não há escapatória. A eminência do ciclo da vida de cada um chegará no verdor da idade para muito, outros experimentaram a idade adulta, uma certa fração, poderão amadurecer, é fato que não se pode prever quais chegarão a velhice, desfrutando – se é que podemos classificar desta forma, ou se não demasiada gentileza – das casas decimais dos 80, 90 ou 100. Há que morrerá repentinamente, ou, afligidos por alguma enfermidade, agonizarão em prazo de tempo.  


         Nem o mais genial dos matemáticos pode equacionar o momento de uma morte, isso, por enquanto, está petrificado nas leis dos fatos (há mortes que são provocadas, com pontualidade de dia e hora previamente agendada, mas creio que não caiba aqui discutir esse tipo, pois discutimos aqui é o seu contesto natural, e não o produzido). Todos temos medo, em menor ou maior intensidade. Nascemos com este entranhado na química que compõe nosso organismo; nossas decisões, escolhas, as direções que seguimos, nossos questionamentos, nossas respostas, conclusões, os sentidos que damos as coisas, nossas crenças, ideais, tudo é feito sobre a tutela do manto do medo. Ele nos observa desde do nosso nascimento até os instantes finais de nossa existência. Não há como vence-lo, e na mesma medida, também não há como vencer a morte.

      Somos adestrados desde sempre a nega-la, a morte, faz parte da construção do nosso consciente e inconsciente, a sensação de que ela está a cada esquina, nos espreitados. “Não posso morrer” é o que pensamos o tempo todo, ou ainda, “ainda não posso morrer, tem muitas coisas para experimentar, só mais pouco de vida” pensaram muitos, como se o cosmos alastra algum tipo de piedade. Queremos ser imortais. A vida eterna é o nosso mais cobiçado bem de consumo, disparado entre qualquer outro. Acreditamos em uma outra vida além desta que temos, isso no conforta: “pobres almas que vagam a infinitude deste universo” diria o senhor Cosmos se este fosse uma personificação fictícia. Mas se a eternidade celestial não é suficiente, ainda nos resta a imortalidade dos nossos feitos, nosso nome ecoando na eternidade. Nossa descendência irá amplificar este nome. Mas não há tantas vagas assim no restrito edital humano para tantos feitos heroicos, e assim, muitos caíram no esquecimento da história. Restando tentar suportar uma quimérica angustia existencial.

      Quanto ao meu controle emocional, depois de ler “A negação da morte”, e tanto divagar sobre o assunto minhas rotinas cotidianas, comecei a caminha junto com o medo, a transforma-lo num acompanhante fictício, o vejo, finjo diálogos, discuto, o aceito e por fim, entramos num gentio acordo: o de não me incomodar tanto. Eu o deixo em paz, e ele faz o mesmo.             

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